A psicóloga Lídia Weber desconstrói os mitos da adoção de crianças e adolescentes
A Agência do Rádio Mais entrevistou a psicóloga Lidia Weber, especialista em adoção, que desconstrói alguns mitos que circulam na sociedade sobre crianças que aguardam por um lar. Ela mostra o que realmente é verdade sobre os pequenos que estão nos abrigos.
Lídia, para começar, a senhora poderia falar se é verdade que filhos adotivos sempre têm problemas?
“É o maior mito que existe na adoção, mas as pesquisas mostram exatamente o contrário. Claro que existem famílias adotivas que podem ter problemas, assim como as biológicas, mas as biológicas têm mais ainda. Então nós temos uma grande pesquisa - feita com crianças e adolescentes que responderam sobre as suas famílias. Nós dividimos [a pesquisa] entre crianças e adolescentes que eram de famílias adotivas e de famílias genéticas. Eles falaram sobre seus pais, sobre as práticas educativas. A maioria das famílias por adoção está mais satisfeita com seus pais do que com as famílias biológicas.”
E em relação às crianças mais velhas que estão no abrigo? Elas sempre têm histórias ruins?
“Sempre um abandono é uma questão completa na nossa vida, mas o ser humano é um ser resiliente. A resiliênia é aquela capacidade que faz com que a gente, às vezes, precise passar por um grande problema e se reerguer depois. E a criança tem uma maleabilidade, uma flexibilidade de comportamento muito grande. Então ela é capaz de se adaptar e de realmente resolver todas as questões. Às vezes, têm histórias muito horríveis e, às vezes, são histórias simples e tristes. O mais importante não é a história horrível das crianças, e sim a família que elas vão conseguir pela adoção.”
E as crianças que já foram adotadas? É verdade que elas sempre pensam na família biológica e tentam procurá-la?
“Nem sempre. Claro que chega um certo momento que podem repensar sua história de vida, pensar ‘por que eu fui abandonado?’. Mas aquela história de que as crianças e adolescentes que sempre vão querer conhecer a sua família, ir atrás, buscar papéis, isso é inverdade. A maioria das crianças que foram adotadas sabem da sua história - e precisam saber -, e elas têm plena consciência de que a família verdadeira delas é a família que as adotou.”
A senhora mencionou que o que importa para a criança que está no abrigo é a família em que ela será inserida. Diante disso, é verdade que, se os pais escolherem a criança, o vínculo é maior?
“Esse é um mito grande também. Não facilita. O vínculo afetivo, ele não vem pronto, ele não é genético. Ele é construído no dia a dia, no olho por olho, na cumplicidade, no envolvimento, e nós temos também dados de pesquisa. A gente comparou aquelas famílias que escolheram as crianças. Elas são mais felizes que aquelas que não escolheram? Dados mostram que não. Tanto famílias que escolheram suas crianças, quanto aquelas que foram designadas, que o juizado chamou para determinada criança - e esse é o processo correto - elas são felizes e têm a mesma qualidade de vida.”
Agora trazendo um pouco para o lado dos pretendentes a pais e mães dessas crianças. Muita gente diz que a adoção deve acontecer de forma natural, e não é necessário ter uma preparação. Isso procede?
“Isso não procede também, aliás, nem para a adoção e nem para ser pai ou mãe genético. Você precisa se preparar. Educar e ter um filho são condições especiais muito complexas. Talvez até a tarefa mais complexa da nossa existência seja educar e socializar uma criança. É difícil, é diferente de 20 ou 30 anos atrás. Hoje é um outro mundo com mais complexidade, com mais agressividade. Então, sim, quem quer adotar precisa se preparar, precisa passar pelos cursos. Mais do que isso, precisa ler, precisa ouvir programas como esse, precisa realmente querer entender outros que adotaram.”
Certo, Lídia. E pra terminar, eu queria saber, é importante que a motivação dos pretendentes seja perfeita na hora de adotar?
“A perfeição não existe. Ela até é ruim quando chega numa questão de compulsão, de tão perfeita que você quer. A motivação perfeita é ‘eu não tenho filho, então eu quero ter um filho’, ou ‘eu já tenho filho e quero ter outro filho’. A principal motivação é que você desejar um filho. Isso é a principal motivação. Não importa se você já tem outros ou não, seja pela via biológica, seja pela via adotiva. A principal motivação é ‘eu desejo um filho’ e, a seguir, é você se preparar para isso.”
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